quinta-feira, 24 de maio de 2012

On the Road: sem unanimidade nem monotonia


Hoje basta um clique suave para fazer uma informação ganhar velocidade. Mas havia uma época em que era preciso fazer barulho, muito barulho, para alcançar velocidade. Por isso, Jack Kerouac precisou fazer disparar as teclas da sua máquina de escrever, como se fossem os motores dos carros dos ruidosos anos 50, para dar corpo a On the Road (Pé na estrada, L&PM, 2004). Foi assim que ele transformou o álcool, as drogas, o jeans e o jazz nos ingredientes do caldo da contracultura americana; e deu aos beatniks um romance sob medida.
                A linguagem concisa, certeira e a narrativa com estilo próximo ao cinematográfico, deixaram gerações de rebeldes com uma, muitas ou nenhuma causa, esperando que On the Road ganhasse vida, som e imagem de cinema. Faltava alguém disposto a aceitar o desafio! E foi Walter Salles quem topou a parada de narrar a história de Sal Paradise (Sam Riley), um aspirante a escritor de Nova Iorque que, após a morte do pai, conhece o ex-presidiário Dean Moriarty (Garret Hedlund) e resolve colocar o pé na estrada junto com ele.
                O filme de Salles foi exibido ontem na 65° edição do Festival de Cannes e tem dividido a opinião dos críticos. Alguns, como Rodrigo Fonseca (jornal O Globo), consideram que a adaptação do romance de Kerouac revela a fase mais madura do diretor brasileiro pela composição dos planos e o trabalho junto aos atores jovens para garantir a dose de rebeldia que a obra exige. Para ele, Salles conseguiu fazer um filme carregado de suor, adrenalina e, sobretudo, tesão.
                Marcelo Miranda (jornal O tempo), por sua vez, considerou que o longa colocou as coisas demais no lugar. As imagens são belas, os planos estão bem posicionados, mas, segundo ele, Salles exagerou na assepsia, tirando a carga de sexualidade e subversão necessária à obra. “O desenvolvimento da caminhada dos personagens, mesmo com algumas ousadias e subversões do status quo social (uso de drogas, prática de sexo grupal, abandono familiar), não transmite o ardor dessas situações.”
                O único aspecto do filme que tem alcançado certa unanimidade é a atuação surpreendente de Kristen Stewart, a mocinha insípida da série Crepúsculo, que esbanjou sensualidade, suor e cabelos desarrumados para virar a musa da rebeldia. E é bom que seja assim, porque unanimidade demais quando se trata de uma adaptação de Kerouac é muita monotonia pro veneno beatnik.   
                  
(Parte do texto foi publicado no Correio da Paraíba, na edição de 24 de maio de 2012)