terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Mon Oncle



Fazer humor não é tarefa das mais fáceis. E fazer comédia de maneira natural, levando o espectador ao riso de forma inesperada é coisa para mestres. Jacques Tati consegue isso duplamente no filme Mon Oncle (Itália/França, 1958), tanto como diretor quanto como ator.

Se o Tati diretor conduz a narrativa de forma que cada cena cômica surja dos eventos mais simples, o Tati ator vai além ao realizar uma interpretação sem trejeitos forçados para parecer engraçados, apesar da forte presença da pantomima.

O personagem de Tati, Monsieur Hulot, é uma espécie de flâneur que encontra abrigo e proteção nas ruas e feiras da cidade. O seu quarto, num cortiço, é apenas um lugar de passagem. Mas a rua é a sua vida.

O flâneur de Tati vê a modernidade com assombro. Ele até transita por ela, pois sua irmã, Madame Arpel (Adrienne Servantie), casada com um proprietário de uma indústria de plástico, Monsieur Arpel (Jean-Pierre Zola), desfruta de todos os luxos e excessos da modernidade.

As cenas mais hilárias, inclusive, surgem do enfretamento do espírito livre e simples de Monsieur Hulot com o aprisionamento gerado pela modernidade e a complexidade inerente a ela.

Hulot não se entende com “os botões de ferro” e as multifunções da modernidade. Mas a irmã e o cunhado insistem em socializá-lo neste ambiente por meio do casamento e do trabalho na indústria de plástico.

As disparidades entre modernidade e tradição são também representadas pela trilha sonora, que mescla sons suaves de acordeom e barulhos estridentes de toda natureza: cortador de grama, chafariz, trava de portão, eletrodomésticos, máquinas industriais, carros...

A ponte entre esses dois mundos é o pequeno Gerald Arpel (Alain Bécourt), sobrinho de Monsieur Hulot, que se vê obrigado a viver no ambiente frio e funcional da residência dos Arpel, embora ele só encontre vida nas muitas andanças que faz com seu tio.

É por isso que os diálogos são quase inexistentes entre tio e sobrinho, pois os gestos afetivos são suficientemente eloquentes.

O filme Mon Oncle mostra, com seu humor cômico-irônico, que o lixo da supercivilidade, como escreveu Eça de Queiroz, serve apenas como uma casca a mais para esconder a pérola que há no fundo da concha: a simplicidade da vida.

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